Em sua coluna para o portal O Fator, Onofre Batista  â sócio do CCBA e professor de Direito Tributário e Financeiro na UFMG â comentou sobre o descaso da polÃtica nacional com MunicÃpios mineradores. Segundo ele, a reforma tributária do consumo “provocou desajustes absurdos” para o setor que ” já haviam sofrido ruinosos prejuÃzos com a Lei Kandir (LC 87/1996), que desonerou a exportação de commodities”.
Confira no texto a seguir:
MunicÃpios mineradores e o descaso da polÃtica nacional 305r5v
A reforma tributária do consumo da Emenda Constitucional no 132/2023 provocou desajustes absurdos para os MunicÃpios mineradores, que já haviam sofrido ruinosos prejuÃzos com a Lei Kandir (LC 87/1996), que desonerou a exportação de commodities.
A mineração, em sua maior parte, se destina à exportação, por isso, os Estados mineradores, que geram recursos financeiros para toda a nação, perderam parcela significativa da receita do ICMS em razão da Lei Kandir. Como consabido, apesar das promessas da União de ajustar a questão, o tal âacerto de contasâ jamais ocorreu. A ADO 25, em que se cobrava reparação, resultou tão somente em um singelo âcala bocaâ. Para se ter uma ideia, o prejuÃzo causado a Minas Gerais superava R$ 170 bilhões, entretanto, foram pagos pouco mais de 5% desse montante. Sempre se soube que as possibilidades de se recuperar esses valores em sede de ADO eram pequenas. Nos tribunais muito foi feito, mas, politicamente, nada se fez. Na verdade, os Estados mineradores acabaram tomando, submissos, um âcanoâ covarde da União.
Os recursos provenientes das extrações minerais devem ficar nos municÃpios em que ocorre a referida atividade. Isso porque o minério se exaure e sua exploração impede atividade diversa: onde se tira minério não se produz nem capim. As receitas são necessárias para que o MunicÃpio possa investir em atividades substitutivas, além de ter de lidar com os danos ambientais provenientes da mineração.
A EC 132/2023 criou o Imposto sobre Bens e Serviços (IBS), que também não incide na exportação de commodities. Entretanto, a repartição da receita global do tributo com os MunicÃpios (os mesmos 25% do ICMS) privilegiou o critério populacional (80% do que cabe aos MunicÃpios serão distribuÃdos na proporção da população municipal), enquanto, com o ICMS, 65% (no mÃnimo) era compartilhado na proporção do âvalor adicionadoâ (que é, grosso modo, a riqueza gerada pelo MunicÃpio). Como a mineração gera relativamente poucos empregos, a população dos MunicÃpios mineradores é pequena, por isso, a fatia que lhes cabe a tÃtulo de IBS deve ser bem menor do que a que receberiam a tÃtulo de ICMS. Uma espécie de morte lenta por sufocamento!
O Imposto Seletivo (IS) é um tributo que deve incidir sobre a âprodução, comercialização ou importação dos bens e serviços prejudiciais à saúde ou ao meio ambienteâ, havendo sido a atividade minerária considerada externalidade negativa no art. 153, § 6º, VII, da Constituição. Ocorre que a receita decorrente do âIS-mineraçãoâ é destinada sobretudo à União e não aos municÃpios impactados! Os Estados e os MunicÃpios mineradores, que sofrem os impactos ambientais, não ficam com praticamente nada da receita do IS-mineração! Pasmem!
A extrafiscalidade exsurge quando o tributo não visa diretamente a arrecadação, mas é tomado como genuÃno instrumento de indução de comportamentos. Nesse como, é inconstitucional a instituição de um tributo extrafiscal com propósitos arrecadatórios se sua incidência não contribuir para a consecução dos objetivos extrafiscais que fundamentaram sua criação.
O IS é o único tributo cuja função extrafiscal é expressamente reconhecida pelo texto constitucional. Entretanto, ninguém quer inibir a mineração. Assim, se não existe uma finalidade inibitória e se o tributo não visa a arrecadação, sua existência apenas se justifica se o tributo tiver uma função compensatória. Nesse como, o IS apenas faria sentido lógico se destinado fosse aos MunicÃpios impactados pela exploração mineral.
Assim, parece mesmo que a interpretação lógica do art. 159, I e II da CRFB/1988 deve se impor e, no caso do IS-mineração, toda a receita deve ser destinada aos MunicÃpios mineradores.
O IS deve ser cobrado independentemente da destinação do produto, a uma alÃquota máxima de 1% do valor de mercado. Nos termos do art. 153, § 6º, I, da CRFB/1988, o IS não deve, a princÃpio, incidir sobre exportações, entretanto, o IS-mineração incide na exportação de produtos minerais, podendo deixar assim um âresÃduo tributárioâ que pode encarecer as commodities nacionais no mercado internacional.
Assim, se somarmos à s perdas proporcionadas pela desoneração das exportações de commodities (Lei Kandir) os prejuÃzos decorrentes da alteração do critério de partilha do IBS, os MunicÃpios mineradores verão receitas significativas serem subtraÃdas.  Para piorar, o IS torna as commodities dos Estados mineradores menos competitivas no mercado e, para piorar ainda mais, a receita tributária não fica com o MunicÃpio que sofre com a externalidade negativa!
Mais uma vez, os municÃpios que enriquecem o paÃs são espoliados e ficam sem os recursos necessários para incentivar atividades substitutivas. Se vivem sob ameaça de serem inundados por lama tóxica, sofrem com a indiferença do legislador nacional e a submissão âentreguistaâ de parte significativa da polÃtica regional. Uma lástima que nos faz ter saudades da velha boa polÃtica mineira!